Vamos falar aqui rapidinho de uma coisa que super me incomoda? É rapidinho, prometo, porque as pessoas precisam, realmente, entender o que isso significa. Só existe isso quando as igualdades existem para todos e isso se torna opção, fora que é preciso que seja algo que mude algo que exista ou que seja totalmente novo; ser motorista de uber não é ser empreendedor, é ser, no mínimo, autônomo.
Empreendedorismo é uma palavra atual, cotidiana e famosa. Tomou o vocabulário do setor de empregos e economia e virou sinônimo de bom emprego, salário alto, autonomia, flexibilidade e garantia de algo certo e que não será preciso, nunca mais, se submeter aos mandos e desmandos de um mercado de trabalho cheio de chefes, líderes, departamentos e ordens. Mas, na prática não é bem isso que está sendo visto.
Na prática temos pessoas gastando montantes de dinheiro para percorrer aquele sonho que uma pessoa bem sucedida realizou, temos pessoas que vivem a pensar no próximo negócio, como alavancar o negócio existente, como prover melhores condições para si, e quando algo não sai como planejado, quando não dá certo, é frustração, tristeza, dependendo do caso depressão.
Mas qual o motivo de falar sobre isso? Responsabilidade, principalmente, do atual mercado de profissionais feitos de maneira imediatista e sem planejamento ou sem preparo. Outro motivo, cuidado, ter atenção ao público que está sendo incitado a ser empreendedor faz a profissão e o ato de empreender parecer fácil ou parecer, no mínimo, comum, onde todos que trabalham de forma autônoma é empreendedor.
Afinal, empreender é, de acordo com William B. Gartner, criar organizações, ou seja, é preciso criar negócio para ser um empreendedor. Sendo assim, muitas pessoas autônomas não criaram, efetivamente, seu trabalho, elas apenas têm um trabalho, cujo líder é ela mesma, sem precisar estar sob hierarquias. Mais ainda, nem todas as pessoas têm como criar alguma organização, algum empreendimento, seja essa condição econômica, social ou psicológica.
Sendo assim, é preciso ter bastante responsabilidade sobre o uso do termo ou o aconselhamento da profissão, uma vez que as pessoas vivem em constantes crises profissionais no tempos atuais, seja uma profissão ameaçada pelas tecnologias, seja ameaçada por profissionais mais jovens, seja por governos que limitam os direitos trabalhistas, forçando muitas pessoas a buscarem refúgio no tal empreendedorismo. Empreender requer investimento e uma ideia original, nem todos estão prontos para dar as entradas principais, seja de um lado ou do outro. Estimular isso na mente de pessoas incapazes de empreender é ser irresponsável, é não ajudar alguém que esteja se enganando por acreditar que irá criar um negócio de sucesso e levará sua família e a si mesmos à tranquilidade econômica almejada por muitos.
Uma deputada brasileira parabenizou a Santa Dulce dos Pobres (nome santificado, após a canonização pelo Vaticano, da Irmã Dulce) enaltecendo seu espírito empreendedor. Mas qual foi o empreendimento de Santa Dulce? Dar atenção e amor aos mais necessitados? Ser caridosa e bondosa? Com todo respeito à Santa, mas isso não foi inventado por ela, bondade e caridade sempre foram atitudes existentes no mundo, talvez pouco praticadas, mas existentes. O uso indiscriminado do empreendedorismo causa situações como essa narrada acima.
O cuidado deve estar no uso da palavra, na confusão que pode ser gerada. Afinal, Irmã Dulce não criou negócios, assim como um motorista da Uber ou um taxista são autônomos e não empreendedores. Também criar sistemas de informação a partir de sistemas existentes, com modificação de algum código ou de algum comando, não é empreender, é colaborar com o projeto desenvolvido por outra pessoa, mas empreender mesmo não é. Isso torna a palavra, a ação e o profissional envolvido em persona non-grata, cria um estigma negativo em torno deles e faz com que se fale mais abertamente, de forma responsável, sobre as possibilidades de novos negócios. Acredito que o que seja preciso, nesse momento, além de responsabilidade e cuidado, é parcimônia no uso do vocabulário e entendimento do que de fato é e como é feito, isso ajudaria bastante os empreendedores e os que pretendem empreender, um dia, quando deixar de ser moda.
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