Achei o texto ótimo, descreve muito bem o "hoje" que vivemos.
"Faz um bom tempo que eu estava querendo escrever algo sobre isso e não sabia como começar. Mas dois vídeos da internet me ajudaram a perfilar um caminho para isso.
O primeiro é um vídeo do “The Daily Show with Jon Stewart” do dia 18 de outubro. O show satiriza notícias da semana (estilo Weekend Update do Saturday Night Live), mas tem um foco bem mais político. Este programa da Comedy Central é um grande ganhador de Emmys – 18 estatuetas - e tem como host Jon Stewart, um dos melhores comediantes da atualidade, na minha opinião. Ele não só é engraçado, como extremamente inteligente e tem um timing invejável. Neste vídeo que cito, Jon convida para uma entrevista o presidente Barack Obama. Quando todos acham que irá surgir dos bastidores um sósia do presidente, os queixos da plaetia caem, pois a figura que surge é o próprio Obama. Segue-se uma sequência de quase 30 segundos de aplausos, gritos e assobios vindos da plateia a saudar o presidente. Após essa calorosa recepção, é dado início a uma entrevista de dois blocos de duração em que Obama joga com o apresentador, entra na brincadeira e ri das piadas feitas pelo comediante.
O segundo vídeo é de um especial do “Late Night with Jimmy Fallon”. Em um quadro chamado Slow Jam the News, Jimmy anuncia que não fará piada com uma notícia sobre Barack Obama, mas irá cantar uma música e não quer fazer isso sozinho. As cortinas se abrem do outro lado do palco e, por de trás delas, surge o próprio Obama. Novamente, gritos e aplausos recebem o presidente. Obama, surpreendentemente faz um 'escada' perfeito para as piadas de Jimmy.
Claro que ficam nítidas tanto a inclinação partidária dos dois programas, que ajudam na imagem do presidente, quanto a esperteza de Obama em participar da brincadeira e desvincular-se temporariamente do ar sóbrio de ser o comandante de uma nação, algo que acredito que Obama já possui.
Aqui começo a minha comparação com o nosso país. Não é de hoje que converso com amigos publicitários que olham as propagandas de Cannes ou as do intervalo do Superbowl como crianças que olham para as prateleiras de uma loja de brinquedos e pensam “quem sabe um dia eu consiga brincar com isso”. Aqui, o burocrático-quadrado-chato do CONAR não permite que uma marca cite a outra. Em outros países, Coca-cola e Pepsi fazem a concorrência abertamente e criando obras incríveis. Obviamente, meu objetivo não é incitar uma marca a falar mal da outra, mas defender que a poda da criatividade com regras duvidosas pode fazer mal para uma obra. A TV brasileira tem o péssimo e burro hábito de mascarar as marcas. Ela chama o telespectador de burro ao achar que não vamos saber do que ela está falando se o assunto for abordado sem a devida clareza. Colocar um desfoque (blur) em uma marca ou dar um significado wikipedistico ao Mcdonalds como “uma famosa marca de fast food de hambúrgueres” beira o ridículo. Isso apenas faz com que a atenção do espectador seja desviada para desfoque e não para a informação principal, traindo as intenções do anunciante. É preciso mais empenho da inteligência nas propagandas, pois, no Brasil, ela ainda é subutilizada.
Nosso país ainda engatinha na questão de liberdade de expressão. Você consegue imaginar um candidato participando e caindo na brincadeira em qualquer programa de humor da televisão brasileira? Nos EUA, um programa pode ser livre para se colocar claramente a favor de um partido, seja democrático ou republicano, e deixar claro isso para todos, sem medo de represálias. Aqui, temos que fazer isso às escuras e com possibilidade do TSE, STJ ou qualquer outra sigla aplicar-nos uma punição que “sirva de exemplo”. Então, eu me pergunto: exemplo para quê? Para que a sociedade continue sendo manipulada por uma imprensa hipócrita que não se posiciona e se finge de neutra? Com o avanço da internet, surgiu uma frescura midiática, uma que aqueles que estão no poder não conseguem mais segurar as informações como conseguiam antigamente.
Vivemos em um país que não é maduro o suficiente de colocar suas mazelas na mesa e discuti-las ou - no âmbito que mais me interessa - fazer humor a respeito. A atitude de colocar para debaixo do tapete alguns assuntos e afirmar “Melhor não falar sobre isso” é vista na maioria das vezes como o melhor remédio, mas, na verdade, cria um círculo vicioso que a longo prazo gera comodismo. Portanto, não se surpreenda com futuras atitudes governamentais que possam lembrar a ditatura. Estou viajando? Então, relembre, por exemplo, a ridícula prisão do presidente do Google no Brasil há poucos meses por consequência da desobediência do site em manter no ar um vídeo que falava mal de um candidato. Viramos o país do “não me toque”, onde humoristas são agredidos no congresso porque cutucaram aquilo que todo mundo quer cutucar, mas não o faz porque simplesmente “é melhor não”.
Uma das citações mais famosas de Voltaire é “Eu não concordo com o que você diz, mas lutarei até a morte pelo seu direito de dizê-lo”. Para mim, infelizmente este direito está se perdendo faz tempo."
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